13 de nov. de 2014

O Apanhador de Desperdícios




Manoel de Barros (Um poeta nunca morre)

Uso a palavra para compor meus silêncios.
Não gosto das palavras
fatigadas de informar.
Dou mais respeito
às que vivem de barriga no chão
tipo água pedra sapo.
Entendo bem o sotaque das águas
Dou respeito às coisas desimportantes
e aos seres desimportantes.
Prezo insetos mais que aviões.
Prezo a velocidade
das tartarugas mais que a dos mísseis.
Tenho em mim um atraso de nascença.
Eu fui aparelhado
para gostar de passarinhos.
Tenho abundância de ser feliz por isso.
Meu quintal é maior do que o mundo.
Sou um apanhador de desperdícios:
Amo os restos
como as boas moscas.
Queria que a minha voz tivesse um formato de canto.
Porque eu não sou da informática:
eu sou da invencionática.
Só uso a palavra para compor meus silêncios
.

21 de set. de 2014

A Paz



Gilberto Gil/João Donato

A paz
Invadiu o meu coração
De repente, me encheu de paz
Como se o vento de um tufão
Arrancasse meus pés do chão
Onde eu já não me enterro mais
A paz fez o mar da revolução
Invadir meu destino
A paz como aquela grande explosão
De uma bomba sobre o Japão
Fez nascer o Japão da paz
Eu pensei em mim,
Eu pensei em ti,
Eu chorei por nós
Que contradição, só a guerra faz nosso amor em paz

Eu vim, vim parar na beira do cais
Onde a estrada chegou ao fim
Onde o fim da tarde é lilás
Onde o mar arrebenta em mim
O lamento de tantos ais.
A paz...
Foto: Marcos Antunes

Penso e Passo



Quando penso que uma palavra
Pode mudar tudo
Não fico mudo
Mudo

Quando penso que um passo
Descobre o mundo
Não paro passo
Passo

E assim que passo e mudo
Um novo mundo nasce
Na palavra que penso

Foto: Wrong_side_of_the_tracks_by_Two_Tickets

14 de jul. de 2014

Nadine Gordimer




"Eu não consigo viver com alguém
 que não consiga viver sem mim"



13 de mai. de 2014

O Amor não Tem nada que Ver com a Idade

José Saramago

"Penso saber que o amor não tem nada que ver com a idade, como acontece com qualquer outro sentimento. Quando se fala de uma época a que se chamaria de descoberta do amor, eu penso que essa é uma maneira redutora de ver as relações entre as pessoas vivas. O que acontece é que há toda uma história nem sempre feliz do amor que faz que seja entendido que o amor numa certa idade seja natural, e que noutra idade extrema poderia ser ridículo. Isso é uma ideia que ofende a disponibilidade de entrega de uma pessoa a outra, que é em que consiste o amor.

Eu não digo isto por ter a minha idade e a relação de amor que vivo. Aprendi que o sentimento do amor não é mais nem menos forte conforme as idades, o amor é uma possibilidade de uma vida inteira, e se acontece, há que recebê-lo. Normalmente, quem tem ideias que não vão neste sentido, e que tendem a menosprezar o amor como factor de realização total e pessoal, são aqueles que não tiveram o privilégio de vivê-lo, aqueles a quem não aconteceu esse mistério."



Foto: Não sei a autoria 

7 de mai. de 2014

Elis Regina




Eu sou do contra.
Não vão me dirigir não. 
Decifra-me ou devoro-te? 
Não vai me devorar nem eu me decifrar, nunca. 
Eu sou a esfinge, e daí? 




Foto: Key_to_success_by_Two_Tickets

25 de abr. de 2014

Meu Sol

Vanguart

Minha alma
Sabe que viver é se entregar

Sabendo que ninguém pode julgar
Se teve que olhar pra trás ou não
Talvez
Se a vida me trouxer o que eu pedi
Te encontro e faço tudo o que quiser
Te dizendo "O Sol renasce amanhã"
A vida é tão mais vida de manhã
Quando vejo você
Saiba você é
Meu Sol
Ela
Tem entrelinhas fáceis de rimar
Me encosta o colo e fica onde quiser
E me molha como um rio que lava o chão
Só pra você
Eu tenho os olhos e meu coração
Espero o teu sorriso e as tuas mãos
Não esquece, o Sol renasce amanhã
A vida, enfim vivida de manhã
Quando tenho você
Sempre você é
Meu Sol
Meu Sol
Saiba você é
Meu Sol
Sempre você é
Meu Sol
Eu já
Me preparei demais
E declaro, agora é a hora
O amor profundo, o amor que salva
Vem depressa, não demora

Meu Sol
Saiba você é
Meu Sol
Sempre você é
Meu Sol

Foto · 'A tarde cai, em cores se desfaz', de Joice Lamego

14 de mar. de 2014

Ana Jácomo



O amor desbasta o ego. Enxuga excessos. Delata as mínguas. Transforma as mágoas. Destrona arrogâncias e idealizações. Desmancha certezas e tece oportunidades. Bagunça a autoimagem todinha, piedade zero, culpa nenhuma. O amor percorre territórios devastados da alma com a calma necessária para reflorestar um a um. Dissolve neblinas. Revela o sol. Destece máscaras. Reinaugura a humildade. Faz ventar. Faz chorar. Faz sorrir. Faz tempestade um monte de vezes pra dizer também céu azul um monte de vezes depois.”


Foto: José Vaz Meneses
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